SIGNIFICADOS

Estou acostumada a não dormir. Mas sempre encontro algo que julgo importante para fazer. Mas esta noite está sendo diferente, não pela ausência de sono, mas por não encontrar nada que aquietasse meu coração. É isto. Não tenho vontade de recorrer aos recursos disponíveis nas madrugadas: TV, leitura, escrever. Quero ir além destas quatro paredes, destes poucos móveis, destes muitos livros… Desejo ir além de mim. Ir além de mim… Posso ir além do que sou diante da impossibilidade de ir? Tenho sonhos e poucos desejos. Neste momento tenho desejo. Preciso sair desta concretude e ir à procura do subjetivo, algo que alimente minha alma, que me tire desta rotina noturna. Noturnamente e só. O que faz na solidão da madrugada um corpo cansado e uma alma solitária?
Vou para a janela da minúscula sala/quarto e debruço-me sobre ela. O muro impede a visão do mundo. Sou eu e a blindagem dos tijolos. Não tenho muita vocação para a alegria, sofro mesmo é de tristezas, mas neste instante sofro da impossibilidade de sair da clausura, de ver caminhos, de sentir o silêncio do mundo. O mundo não para, ele é movimento constante, mas numa cidade pequena, os barulhos dormem e ficam apenas os sussurros da natureza humana.
Num impulso subi numa cadeira fria e lisa.Vi o mundo inerte. Apenas algumas luzes indicavam que havia vida no silêncio profundo. Aos poucos, nada acontecendo, aproximei meu corpo do encosto e abandonei-me de olhos vazios sem pensar.
Acordei bem cedo. Meu corpo doía muito – mas não queria repousar! – Lembrei-me com desgosto da madrugada em que tentei sair da domesticação noturna com a sensação de ser um animal que não cabia mais dentro da sua jaula. Lembrança gratuita, livre e até imaginada… Tive saudades de me sentir de novo. Olhei para um lado, para o outro, vi meus livros, meus poucos móveis… Ali estavam os meus significados. Ali morava a minha vida.

Alda Alves Barbosa