O espelho

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Descobri que o espelho é o objeto que preciso retirar do meu convívio. Não sinto nenhum prazer em ver minha imagem refletida nele. Estou envelhecendo! A flacidez, as rugas, os cabelos esbranquiçados me incomodam, entristecem-me.

Se insisto em me olhar é outra que vejo. Outra… Quem? Eu? Sim. Eu jovem, eu dançante, eu, esperançosa, eu, derramando sonhos! Domestiquei meu espelho. Não percebi que estava sempre viajando com o tempo. Nunca desarrumei as malas, não precisava, a viagem era contínua, sem pausas, sem estações.

E hoje, olhei fugitivamente para ele – o espelho – e tentei alcançar os segundos. Uma pergunta instalou-se em meu cérebro entorpecido: quem era aquela pessoa que me olhava? Me perturba mais descobrir que sou eu, ainda que diferente de tudo que fui ou pensei ser. Ali estava eu com outra face, com outro olhar. Percebi que vi em mim o que eu sempre fui. Que eu sou a minha própria bagagem. Aonde eu vou eu me levo. O excesso de peso é a minha nudez diante do que sou.

A flacidez, as rugas, as rusgas foram desenhadas pelo tempo e coloridas com seus pincéis descoloridos, flácidos! O que me espanta é essa geografia no corpo, no rosto. No espelho da viagem no tempo eu retorno para dentro de mim… Não há como me transformar em outra pessoa.

Dentro de mim a viagem continua… Sem pausa, sem estações! O tempo…

Alda Alves Barbosa

Mais um Outono

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Mais um outono…
Sinto-o entre os dedos
numa rutilância fria
de abstrata nudez.

A minha alma geme…
Dor que o tempo me impinge
com badaladas descompassadas
de quem andou todas as
estradas e só me resta
os cansaços e o escuro
dos becos.

Perto, o inverno me
aguarda como pedras mortas.
E eu, passageira do tempo,
dos sucessivos segundos,
vou indo ao seu encontro
sem deixar continuidade

De mim…

Alda Alves Barbosa

ATÉ TU, OAB?

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Não concebo a ideia de escolher estradas sem olhar para as minhas caminhadas dos ontens. Elas me dão suporte para avaliar minhas escolhas. E por pensar assim, percorro meu passado criança, abraço as esculturas do meu cerrado e aspiro seu cheiro verdejante. Tempos bons aqueles! Jabuticabeiras, pequizeiros, cagaiteiras, enfim, todas as eiras. Hoje, sem eira nem beira, oscilo entre o viver e o morrer… Quero viver, mas não sei se a soja contém todos os nutrientes que o meu corpo necessita.

Sei não. Minh’alma anda aos suspiros, perigando o choro, pelos sumiços do cerrado desse meu sertão… Hoje a árvore existe, amanhã a danada inexiste. Parece mesmo coisa de assombração: cá na minha cabeça, fico matutando – ” Será que espantaram o cerrado? “

Pra piorar a situação, meu coração fica remoendo. Se pelo menos nossa Unaí tivesse umas sete arvorezinhas em cada rua!… tem não. Se tiver, quer apostar que qualquer dia desses elas tomam chá de sumiço? Parece mesmo coisa do tinhoso! Trem esquisito, árvore sumir num piscar de olhos!

Quer ver árvore desaparecer, é quando resolvem construir um é-difício ( não é-fácio ). A árvore vai pro pau e ainda deixam seu tronco pintado de branco como um troféu a ser comemorado.

Mas o que me causou mesmo estranheza foi o jeito que encontraram pra matar a pobre da árvore que estava ( e ainda está ) atrapalhando a ” beleza ” da Sede da OAB em Unaí. Pena de morte não concedida, eis que ela me aparece desgalhada, numa nudez vergonhosa. Se fosse só pelos arrepios do terrível frio unaiense, vá lá, pior mesmo foi a feiura que deixaram ela. Se dependesse de mim, todos seriam processados por danos morais, afinal,quem desnuda uma árvore a paga é o castigo.

UTI. Último recurso. E consciente de que faltam médicos, arquitetos, jardineiros, paisagistas… fico eu de olho nela, tenho receios de que no prontuário, a letra do médico esteja pouco legível e a enfermeira ” por engano “, aplique café com leite nas veias da então sofrida paciente e ela venha a fenecer.

Por esta situação ser corriqueira, eu não deveria me assustar nem me indignar, afinal, a repetição torna o incomum em comum. Fico me perguntando, como será daqui um tempo o nosso chão, caso a linha de raciocínio do seu povo não mude. Nossa população – com raríssimas exceções – tem uma visão catastrófica com relação a um clima ameno, flores, sombra e beleza. Árvores sujam o chão. Bonito mesmo são as calçadas caras e escorregadias. Bom mesmo é chegar o verão e o “calor dos infernos” acordar.

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Alda Alves Barbosa