Mais um causo unaiense – (verdadeiro)

BEM VINDO

Sete horas. Manhã quente e uma preguiça morna. “Enfrentar a manhã tão cheia de sol, imagina à tarde… à noite… Melhor não pensar.” Nara espreguiçou-se e afastou os pensamentos. Hora de trabalhar! Vestiu-se rapidamente e subiu à rua grande que já era Av. Governador Valadares e os postes já haviam sido retirados do meio da rua.

Como todos os dias, com exceção dos domingos, lá estava seu tio muito bem vestido e perfumado sentado confortavelmente numa cadeira de tiras de plástico vermelhas à espera de um freguês ou de um parente/amigo para jogar conversa fora ou para um dedinho de prosa.

Nara tomou a benção – era seu tio/avô -, e subiu à pequena e estreita escada de madeira, “Calor dos infernos – Unaí é assim: no verão um calor insuportável e chuvas intensas pra fazer lamaçal. O inverno era gostoso; frio bom, as muriçocas davam trégua e podíamos usar cobertor, Ah, a primavera! Flores no cerrado, pequenas, humildes, mas bonitas. Do outono só sei o que me ensinaram no Grupo Escolar Domingos Pinto Brochado: estação das “verduras.”

Olhou o tio/avô sentado lá fora apreciando o calor e, num impulso, pegou o telefone negrão e numa voz sensual ligou para o outro que ficava na parte de baixo da loja e disse:
– Bom dia, o Senhor Antônio, por favor.
– Pai, telefone chamando o senhor. “(esquisito), mas era assim.”
– Senhor Antônio, bom dia. Meu nome é Sandra e passei agorinha na porta da loja e vi o senhor sentado, etc… Como o senhor está bonito com esta camisa listrada de azul e esta calça caqui. Tão bem penteado… E o perfume? Bom demais.
– Sentiu meu cheiro lá do meio da rua?
– Sim, senti. Estou aqui a imaginar como seria bom sentir este seu perfume abraçada a você!
– (silêncio)
– Olha, eu ligo amanhã. Não vejo a hora de revê-lo. Desligou. Seu tio/avô ajeitou os óculos no nariz e com um sorriso sorrateiro voltou a sentar-se.

No outro dia ele estava impecável. Outro telefonema e mais perfume “Madeira do Oriente.”
As chamadas via telefone continuaram por mais de um mês sem intervalos. Muita roupa, muita brilhantina e muito perfume foram comprados. O “Madeira do Oriente,” antes jogado em gotas no corpo, na roupa, no cabelo, agora como rios jorrava pelo seu corpo.

Exalava felicidade. Estava na idade do lobo, e Nara com os outros funcionários morriam de dor de cabeça e/ou náuseas. Atendendo a pedidos (cansaço das reações adversas do rio de perfume madeira), o telefone emudeceu para esta finalidade.

Lá de cima, na contabilidade, Nara testemunhava a ansiedade com que ele esperou durantes dias por um telefonema. Seu rosto havia perdido a alegria; o bigode chinês ficou mais acentuado… Estava apaixonado!…

Alda Alves Barbosa