Apesar de intenso…

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E em silêncio eu amava… Amava intensamente muitas… tantas… muitas! Amava com prazo de validade. Meu amor poderia durar até o outro amanhã ou até a próxima hora… Nenhum amor ficou para presenciar o nascimento dos vincos em meu rosto; nenhum amor ficou para ver os rios de águas azuis desaguando em minhas mãos; nenhum amor ficou para me desamar.

Hoje procurei vidas pelos cantos de minha vida. Não ouvi nenhum choro,nenhum riso… O espelho, amarelecido por décadas de inércia refletia com dificuldades um rosto duro, um olhar raso, muitas ranhuras pelo corpo molemente descolorido, miserável… Ali residia um corpo sem vida, coberto de tempo!

Alda Alves Barbosa

Mais um causo unaiense – (verdadeiro)

BEM VINDO

Sete horas. Manhã quente e uma preguiça morna. “Enfrentar a manhã tão cheia de sol, imagina à tarde… à noite… Melhor não pensar.” Nara espreguiçou-se e afastou os pensamentos. Hora de trabalhar! Vestiu-se rapidamente e subiu à rua grande que já era Av. Governador Valadares e os postes já haviam sido retirados do meio da rua.

Como todos os dias, com exceção dos domingos, lá estava seu tio muito bem vestido e perfumado sentado confortavelmente numa cadeira de tiras de plástico vermelhas à espera de um freguês ou de um parente/amigo para jogar conversa fora ou para um dedinho de prosa.

Nara tomou a benção – era seu tio/avô -, e subiu à pequena e estreita escada de madeira, “Calor dos infernos – Unaí é assim: no verão um calor insuportável e chuvas intensas pra fazer lamaçal. O inverno era gostoso; frio bom, as muriçocas davam trégua e podíamos usar cobertor, Ah, a primavera! Flores no cerrado, pequenas, humildes, mas bonitas. Do outono só sei o que me ensinaram no Grupo Escolar Domingos Pinto Brochado: estação das “verduras.”

Olhou o tio/avô sentado lá fora apreciando o calor e, num impulso, pegou o telefone negrão e numa voz sensual ligou para o outro que ficava na parte de baixo da loja e disse:
– Bom dia, o Senhor Antônio, por favor.
– Pai, telefone chamando o senhor. “(esquisito), mas era assim.”
– Senhor Antônio, bom dia. Meu nome é Sandra e passei agorinha na porta da loja e vi o senhor sentado, etc… Como o senhor está bonito com esta camisa listrada de azul e esta calça caqui. Tão bem penteado… E o perfume? Bom demais.
– Sentiu meu cheiro lá do meio da rua?
– Sim, senti. Estou aqui a imaginar como seria bom sentir este seu perfume abraçada a você!
– (silêncio)
– Olha, eu ligo amanhã. Não vejo a hora de revê-lo. Desligou. Seu tio/avô ajeitou os óculos no nariz e com um sorriso sorrateiro voltou a sentar-se.

No outro dia ele estava impecável. Outro telefonema e mais perfume “Madeira do Oriente.”
As chamadas via telefone continuaram por mais de um mês sem intervalos. Muita roupa, muita brilhantina e muito perfume foram comprados. O “Madeira do Oriente,” antes jogado em gotas no corpo, na roupa, no cabelo, agora como rios jorrava pelo seu corpo.

Exalava felicidade. Estava na idade do lobo, e Nara com os outros funcionários morriam de dor de cabeça e/ou náuseas. Atendendo a pedidos (cansaço das reações adversas do rio de perfume madeira), o telefone emudeceu para esta finalidade.

Lá de cima, na contabilidade, Nara testemunhava a ansiedade com que ele esperou durantes dias por um telefonema. Seu rosto havia perdido a alegria; o bigode chinês ficou mais acentuado… Estava apaixonado!…

Alda Alves Barbosa

Réquiem

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O sino tange distante, eu entrelaço minhas mãos às suas e nossos olhares encontram os céus.

Hoje estamos juntos… Nada sabemos do amanhã, do depois de amanhã… Desejamos apenas estes instantes, o próximo que vier…

Nossas mãos irromperam as nuvens… Embaixo um amontoado de pessoas acompanham lentamente um triste réquiem.

E nós dois – separados pela eternidade!

Alda Alves Barbosa

Quem

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Quem me roubou a noite e
levou consigo o perfume
que alastra a minha poesia?

Quem me roubou a fantasia
de ser e não ser…
Quem me roubou o direito
de parir a flor poética
para enfeitar meus amanhãs?

Quem me fadou ao desespero
secando a nascente dos poemas
secando o solo onde borbulhava
o re(canto) das palavras?

Quem me arrancou
o sonho,
a vida,

Quem?

Alda Alves Barbosa

Talvez

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Dormi demais! Acordar implica em viver, em morrer. Não desejo viver, nem morrer. Desejo apenas dormir… prolongar o tempo da minha ausência no cotidiano. Não estou na vida de ninguém, ninguém está na minha vida… Vivo no vazio do sono sem os pesadelos do real.

Hoje meu universo são as paredes do meu quarto. Nele eu vivo o que hoje eu desejo viver: o sono.

Talvez quando a madrugada chegar eu a abrace… escreva uns versos. Talvez… Porque hoje eu só desejo dormir.

O amanhã… O que me importa o que está por vir? Quando o amanhã se tornar hoje, talvez eu queira continuar dormindo, ou não.
Tudo é um talvez!…

Alda Alves Barbosa