Na criança que fui e na mulher que hoje sou, nasceu na infância. Nessa fase fui me percebendo e percebendo o mundo. Me perceber enquanto ser humano, sempre foi um processo difícil. Não entendia e continuo não entendendo a vida, a morte… Era e continua sendo angustiante essa terrível ausência de respostas. Acho que sou uma pessoa torturada pelos porquês.
Da janela da minha infância fui me preparando para ser o que sou. Se vi e vivi tantas situações lúdicas, também vi e vivi as desgraças oriundas do estado ditatorial do coronelismo. Trevas que atingiram a mesa da minha família e que inundaram também a mesa de muitos.
Naquele tempo o sertão era grande, mas seu povo era pequeno. Ali, estava a casa que eu nasci e que continua existindo dentro da minha memória. Vivo e não vivo mais aquela criança que perdia o medo porque sabia-se que no quarto ao lado haviam dois anjos para afugentar o lobo mau, o lobisomem, as almas penadas, a desgraça (mulher alta com uma enorme trouxa na cabeça) a mula-sem-cabeça…
Relâmpagos riscavam o céu; trovões (papai do céu ralhando); um rio de vento e as primeiras gotas de chuva caiam. Começava o inverno das águas. Um mês de chuva ininterrupta. o Rio Preto tecia fúrias; ruídos invisíveis; monstros engolindo cerrado… Medo? Sim, mas sabia-me protegida. No assoalho retumbava os passos da minha segurança esvaziando as bacias que amparavam as goteiras.
E eu ouvia – “Sai da janela, menina. O luar só voltará quando a chuvarada passar.” Invernou mesmo! Ralhava minha mãe!
Alda Alves Barbosa