Ensaio sobre a insônia Unaiense

“Entre quatro paredes”, peça idealizada por Sartre, aborda o “inferno” do não/dormir. As pessoas são condenadas a permanecer acordadas. E mais que isso: não têm pálpebras e, portanto, não podem fechar os olhos. Isto demonstra que não conseguem obter uma nesga de privacidade para desfrutarem desse mínimo e necessário alívio. Os condenados, apresentados pelo filósofo francês, Jean Paul Sartre, milhões de insones atravessam noite após noite o inferno das horas que sugerem a duração da eternidade. Mas não precisamos ir à França dos anos l944, para viver a angústia da insônia. Em Unaí, em alguns bairros, vivemos este inferno: “a insônia induzida “. Estamos condenados a passar as noites, sobressaltados com o barulho dos pneus se arrastando pelo asfalto, os gritos advindos dos ocupantes dos veículos, “os rachas”, as buzinas acordando os já eternamente acordados. Quando se trata do não/dormir em Unaí, é necessário ir além dos desencadeamentos físicos e psíquicos. O ato de dormir necessita do silenciar das ruas e do silenciar da mente. Um depende do outro para o repouso dos sentidos. Como repousar com a “sonoplastia” dos carros em  alta ou pouca velocidade?. As imitações “de música” ferem os nossos ouvidos e despertam os já despertos. O barulho chamado de ritmo, a letra de duplo sentido ou sentido único ou sem sentido nenhum, atacam os nossos estômagos com a náusea do desagrado. Os pneus cantam a música daqueles que acreditam que a “morada eterna” são para os que estão no mundo há tempos; sentem-se acima do bem e do mal, da vida e principalmente da morte: São deuses gregos, Apolos do século XXI. Deuses que se destroem através do conhecimento de que “há mais coisas dentro do carro que imagina a nossa pequena imaginação”. Deuses que nas suas onipotências, escravizam os outros à eterna privação do sono, abrangendo todas as faixas etárias ou gêneros. É um status de epidemia caracterizada  pelos sintomas de falta: falta de limite, falta de educação, falta de respeito e com apenas uma certeza, a certeza da impunidade. Nesta “certeza” eles têm razão. As leis existem para os que são “invisíveis “aos olhos das chamadas “classes superiores”. Vinte e quatro horas despertas pagam o preço da privação do sono: comprometimento da aprendizagem e do raciocínio lógico, instabilidade do humor e prejuízos para a memória, entre tantos outros.. Vinte e quatro horas acordados… É inevitável a sonolência em algum período do dia, mas os meios de comunicações existentes em Unaí   (emissoras de rádio, Canal de TV , inúmeros jornais  e internet) não conseguem evitar a necessidade de  carros de som com volumes ensurdecedores fazendo anúncios que poderiam ser feitos em nossos bons meios de comunicações e nós, futuros compradores dos produtos anunciados, ficaríamos eternamente agradecidos.  “Para alguns “eternamente eternos”, só o período da noite não é suficiente para os “rachas”, mostram a “cara” em pleno dia e “sugerem” aos motociclistas que “envenenem “suas motos e as façam girar sobre elas mesmas. Seria um belo espetáculo circense se o circo não fosse as ruas e os espectadores prováveis vítimas de atos irresponsáveis e narcísicos. Aqui convivemos com o medo de ver nossas casas invadidas por carros e motos (fato já acontecido) e quase inevitável que aconteça de novo. Ver uma reação a este desrespeito a que nos submeteram os “deuses gregos imortais”, que roubam o nosso sono, o nosso sossego, é o meu sonho que sonho acordada.

Ilustração: Revista Mente e Cérebro, Nº 170

5 pensamentos sobre “Ensaio sobre a insônia Unaiense

  1. Oi Alda! Adorei seu texto, pois todas as vezes que estou em Unai, passo por isso. a rua em que minha mãe mora ( que é a sua tambem) é invadida todas as noites por esses filhinhos de papai que fazem da mesma um local de corrida e cavalos de pau. Me pergunto até quando? Será que por serem flhinhos de papai não tem punição para eles? Ou será que Unai ainda continua uma terra sem lei? Espero de coração que um dia tudo isso seja resolvido e possamos voltar a dormir tranquilamente. Aguardo anciosa seus maravlhosos textos viu? Bjos…

    • Eduardo, não sou ranzinza não, o meu corpo está apenas obedecendo a natureza humana. Tenho sono, preciso dormir e -para isso preciso da quietude da nossa Unaí. Não posso me deslocar até a lua como você sugeriu, sou brasileira e, brasileiro quer pouco, pede pouco e tem pouco porque merece ter só esse pouco . Pensando bem, já poluimos o nosso planeta e rapidamente seremos uma espécie em extinção, e o universo agradecerá a Deus por isso, então Eduardo, para quê ir até a lua se ela é bonita na sua inteireza sem precisar de nós, seres ridicularmente pequenos e destruidores? Propositalmente ela está muito distante de nós “terráqueos”, justamente para que ela possa “ficar eterna”, sem a nossa interferência desastrosa. A lua… Eu a olho da janela do meu quarto, na impossibilidade de conciliar o sono , eu a vejo na sua magnificência enquanto me for dado o direito, pois qualquer dia fenecerei como as plantas, as águas, os animais (considerados irracionais) estão fenecendo e logo também deixarão de existir, culpa nossa, que destruimos “os que têm vida mas não têm voz para o grito), eu tenho voz , posso gritar e estou pedindo socorro, pois mesmo não sendo determinista, acredito que a minha partida deste mundo, como a dos que fazem “rachas” ou “cavalos de pau”, pode acontecer antes da hora quando um carro em alta velocidade… Obrigado pela sua opinião, eu estou expondo novamente a minha, e agradeço por ler os meus “escritos”. Estarei sempre disposta a discutir qualquer assunto ,desde que não haja agressividade. Mais uma vez, obrigada. Um abraço, Alda

  2. Por que tanto barulho meu Deus?

    Certamente para tentar preencher o vazio existencial que vai pelas almas ocas dos motoristas e motociclistas ruidosos que vagam, quais zumbis, por (suas) noites igualmente vazias.

    Menos que “deuses gregos” (ainda que do século 21, Era do Pós-Tudo), mais parecem figuras dionisíaco-esquizofrênicas retiradas de alguma peça do teatro do absurdo.

    Vampiros do sono alheio, alimentam seu vazio da insônia do outro. Por ocos, talvez nunca cheguem a compreender que Deus habita o silêncio.

    Junte-se ao barulho dos motoristas e motociclistas zumbis o ruído das carretas-monstro que também infestam a área residencial da cidade.

    Parte do Centro transformou-se em estacionamento dessas jamantas. São motores ruidosos rompendo um naco de silêncio das madrugadas dos insones. Um descalabro, para dizer o mínimo.

    Lá pelas tantas, as cortinas se fecham para carros e motos, as carretas passam a ocupar a boca do palco nas horas finais da madrugada: “DURMA-SE COM UM BARULHO DESSES”.

    Querem a comprovação? É só pernoitar nos arredores do convento, mais precisamente próximo à esquina das ruas Calixto Martins de Melo com Roncador, ao que consta área ainda residencial, embora o tempo esteja se encarregando de mudar rapidamente essa realidade.

    E o silêncio, tão caro aos insones?

    Autoridades e sociedade, mexei-vos!!!!

    Ou talvez seja preciso criar a Sociedade dos Insones Unaienses (SIU), a fim de que, em meio à barulheira, possam nos ouvir.

    Ops! Melhor seria PSIU…
    Um mínimo de silêncio, por favor, que agora queremos dormir.

    • Ricardo Ribas, o seu comentário veio de encontro aos meus pensamentos. Temos hoje uma juventude que de certa forma me “horroriza”, me faz temer o futuro daqueles que cultivam sonhos para serem realizados no decorrer do tempo. E todos os dias, infalivelmente, eu presencio as “faltas de…”, penso como pessoas tão despreparadas para “estar no mundo”, motivadas por atos insanos, que não toleram o silêncio porque receiam o “encontro consigo mesmos. Medo? Acredito que sim. Medo de se “saberem sós”, medo de se saberem que dentro deles habitam o vazio por ausência de valores, de intimidade com o próprio mundo construídos por eles mesmos. Construção pautada nas ausências de “ser”, no predomínio de “ter”, nas “faltas de…” e de sentimentos que dão significados a vida. Diante de uma realidade tão triste, me pergunto todos os dias, como será o amanhã deste país, deste estado, deste nosso chão, se hoje olhamos estupefatos para os atestados de “ignorantes” que nos presenteiam todos os dias? Como será o amanhã de nossos filhos, netos, bisnetos, nas cabeças e nas mãos (como o sr. disse com propriedade) de “figuras Dionísicas/esquisofrênicas retirados do teatro do absurdo”, exprimindo as forças irracionais que conduz o homem à dissolução do ser, à decadência, à tragédia do existir? Estão vivendo no “spirito Dionisíaco”, na peça, ou estão nos” pregando uma peça”? Se estivermos assistindo uma peça Dionísica “La nascita della tragedia” e ao final da peça certamente as cortinas fecharão e o teatro do absurdo continuará fora das paredes que limitam o teatro, espalhando pelas ruas, que por ser uma cidade pequena, deveriam ser tranquilas, o medo, o caos, o sofrimento, através da insensatez de quem foge de si mesmo levando o seu “inferno pessoal” aos que criaram coragem e saíram da caverna ao encontro ou à procura de si mesmo. Se o PSIU não resolver, fundaremos o SIU, ou será que já que estamos tão amigos de Hugo Chaves, podemos solicitar o “Toque de Recolher”, não seria má ideia. Obrigado pelo seu comentário, gostei muito e gostaria que me visitasse sempre o site. Vem aí “Terra Sonâmbula”. Um abraço e mais um vez obrigado.

Sua opinião é importante para nós. Participe com um comentário!

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s